Análise de Conteúdo
A análise de conteúdo é “um método muito empírico, dependente do tipo de «fala» a que se dedica e do tipo de interpretação que se pretende como objectivo. Não existe pronto-a-vestir em análise de conteúdo, mas somente algumas regras de base, por vezes dificilmente transponíveis. A técnica de análise de conteúdo adequada ao domínio e ao objectivo pretendidos tem de ser reinventada a cada momento, excepto para usos simples e generalizados, como é o caso do escrutínio próximo da descodificação e de respostas a perguntas abertas de questionários cujo conteúdo é avaliado rapidamente por temas”(Laurence Bardin, 2008, p. 32)».
Mais adiante, a autora afirma na obra citada: “A análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações. Não se trata de um instrumento, mas de um leque de apetrechos; ou, com maior rigor, será um único instrumento, mas marcado por uma grande disparidade de formas e adaptável a um campo de aplicação muito vasto: as comunicações”(Ibidem, p. 33.
A análise de conteúdo (Cf Ibidem, pp.121-128), organiza-se em três pólos cronológicos: a pré-análise, a exploração do material e, por fim, o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação.
A primeira parte, a pré-análise, procura alcançar três objectivos: a escolha dos documentos a serem submetidos à análise, a formulação das hipóteses e dos objectivos e a elaboração de indicadores que fundamentem a interpretação final. De realçar que estes pólos não têm necessariamente de se suceder cronologicamente, embora a sua ligação esteja implícita.
A primeira actividade, a leitura flutuante, «consiste em estabelecer contacto com os documentos a analisar e em conhecer o texto deixando-se invadir por impressões e orientações”(Ibidem, p.122).
De seguida, faz-se a constituição do corpus a analisar, que é delimitação do material a analisar. Para esta determinação podemos seguir as regras da exaustividade, da representatividade, da homogeneidade e, por último, da pertinência. Tudo isto está inerente ao tipo de investigação que se está a realizar e que tipo de respostas se procura obter.
A seguir vem a formulação de hipóteses e de objectivos. Entendendo-se por hipótese «uma afirmação provisório que nos propomos verificar (confirmar ou infirmar), recorrendo aos procedimentos de análise(…). O objectivo é a finalidade geral a que nos propomos (ou que é fornecida por uma instância exterior, o quadro teórico e/ou pragmático, no qual os resultados obtidos serão utilizados» (Ibidem, p. 124). De realçar que as hipóteses nem sempre são estabelecidas previamente, as análises ditas ‘às cegas’ deixam que o material fale e daí emergem as hipóteses.
O passo seguinte é a referenciação dos índices e a elaboração dos indicadores. O índice é a menção explícita de um tema numa mensagem, e os indicadores acabarão por ser a precisão textual que nos permite afirmar que se está a ‘tocar’ na matéria que integra os índices previamente estabelecidos. «Se se considerarem os textos uma manifestação que contém índices que a análise vai fazer falar, o trabalho preparatório será o da escolha destes – em função das hipóteses, caso elas sejam determinadas – e sua organização sistemática em indicadores» (Ibidem, p.126).
Está pré-análise – que não é tão ‘pré’ quanto isso, como vamos ver a seguir – termina com a preparação da matéria para poder ser trabalhado, por exemplo, a transcrições das entrevistas e a sua uniformização gráfica.
A segunda parte é a exploração do material. Se a fase anterior tiver sido realizada de forma conclusiva, esta fase não é mais do que a aplicação sistemática das opções tomadas. Daí que os recursos informáticos são, também aqui, uma mais-valia muito grande.
A terceira e última fase é a do tratamento dos resultados obtidos e sua interpretação. Os resultados ‘brutos’ obtidos na fase anterior são tratados de forma a serem significativos e válidos. Para que haja um maior rigor, estes dados devem ser submetidos a testes de validação. O analista «tendo à sua disposição resultados significativos e fiéis, pode então propor inferências e adiantar interpretações a propósito dos objectivos previstos – ,ou que digam respeito a outra descobertas inesperadas. Por outro lado, os resultados obtidos, a confrontação sistemática com o material e o tipo de inferências alcançadas podem servir de base a uma outra análise disposta em torno de novas dimensões teóricas»(Ibidem, pp.127-128).
© Laurence Bardin 2008
A codificação
Tratar um determinado material é codificá-lo (Ibidem, p. 129). «A codificação corresponde a uma transformação – efectuada segundo regras precisas – dos dados em bruto do texto, transformação essa que, por recorte, agregação e enumeração, permite atingir uma representação de conteúdo, ou da sua expressão; susceptível de esclarecer o analista acerca das características do texto, que podem servir de índices» (Ibidem, p. 129).
Unidades de registo – «É a unidade de significação a codificar e corresponde ao segmento de conteúdo a considerar como unidade de base, visando a categorização e a contagem frequencial» (Ibidem, p. 130). A autora dá como exemplo de unidades de registo a palavra, o tema, o objecto ou referente, o personagem, o acontecimento, e o documento (Cf Ibidem, pp. 131-132).
Unidade de contexto – «A unidade de contexto serve de unidade de compreensão para codificar a unidade de registo e corresponde ao segmento da mensagem, cujas dimensões (superiores às da unidade de registo) são óptimas para que se possa compreender a significação exacta da unidade de registo» (Ibidem, p.133)
Categorização
A categorização «é uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto de por diferenciação e, seguidamente, por reagrupamento segundo o género (analogia), com critérios previamente definidos» (Ibidem, p. 145).
As categorias são rubricas ou classes que agrupam um grupo de elementos, que são, no nosso caso, as unidades de registo. Estes elementos são agrupados devido ao facto de terem características comuns. As categorias procuram dar de forma condensada uma imagem simplificada dos dados em bruto.
Os critérios de agrupamento podem ser: semânticos, sintáticos e expressivos (Cf Ibidem, pp.145-146).
Uma categoria pode dizer-se que é boa quando possui as seguintes qualidades: a exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, objectividade e fidelidade, e a produtividade.
Concluo, referindo que “a análise de conteúdo assenta implicitamente na crença de que a categorização (passagem de dados em bruto para dados organizados) não introduz desvios (por excesso ou por recusa) no material, mas que dá a conhecer índices invisíveis, ao nível dos dados em brutos» (Ibidem, p. 147)
Reflexão sobre a minha experiência nesta actividade
No início, fiquei fascinado com as potencialidades que se poderia obter com este ‘instrumento’ de trabalho. Procurei seguir os diversos itens que a actividade propunha e comecei a sentir-me desorientado, pois não tinha a certeza de que estava a trabalhar bem.
Procurei informar-me melhor, ler e reler as instruções, a bibliografia e o texto (entrevista) que tinha diante de mim. Senti o pêndulo do tempo a encurralar-me, a asfixiar-me.
Posteriormente, e graças as diversas intervenções que fui vendo na plataforma da UC, percebi que o meu problema tinha sido uma rigidez excessiva, não ter deixado que, na primeira fase de análise – a leitura flutuante – os temas e ideias fossem emergindo ao seu tempo. Pretendi dominar o texto e não deixei que ele falasse, não dei espaço ao texto.
O que mais me irrita em mim neste processo, é que eu tinha obrigação de deixar o texto falar, pois em Teologia aplica-se o método da Leccio Divina, que tem muitas semelanças.
Mas o medo da subjectividade tolheu-me, mas percebi que ela é inerente à análise, e um bom analista só surge depois de muito treino, enriquecido com o contributo de alguém mais experiente e com o recurso a peritos na matéria e aos pares, consoante a fase da análise em que se está.
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Laurence Bardin, Análise de Conteúdo(edição revista e aumentada), ed. 70, Lisboa 2008.