Cristão Adulto X

Cristão Dialogante

Um cristão adulto procura, quer e esforça-se pelo diálogo com todos, nomeadamente com aqueles que procuram em Deus o sentido último da sua existência. O diálogo, como movimento de aproximação é o processo de busca da unidade. Esta unidade através do diálogo com outros Credos denomina-se ecumenismo, quando realizado entre cristãos, e diálogo inter-religioso quando a busca de aproximação é feita com crentes de outras religiões não cristãs.
O ecumenismo e o diálogo inter-religioso são um assunto fascinante e desafiador. Abordar estas questões requer, antes de mais, um exercício de despir-se de preconceitos ou qualquer outro tipo de resistência. Mas, acima de tudo, urge sinceridade e clareza nas nossas convicções e posições.
Há aspectos que são meramente circunstanciais, fruto de um percurso da história humana num determinado espaço e num determinado tempo, mas há coisas que são fundamentais e, abdicando delas, abdica-se do essencial da fé no Deus verdadeiro, que tem a plenitude da Sua revelação em Jesus Cristo. É o próprio Senhor Jesus que nos pede um caminho em direcção à unidade quando diz: «que todos sejam um só, como Tu, Pai, estás em mim e Eu em ti; para que assim eles estejam em Nós e o mundo creia que Tu me enviaste»(Jo 17, 21).

No diálogo a Igreja torna-se mais fiel
O esforço pela unidade realiza a própria renovação da Igreja, na fidelidade à sua própria vocação: ser Sacramento Universal de Salvação.
Mas não há verdadeiro ecumenismo sem conversão interior. É que os anseios de unidade nascem e amadurecem a partir da renovação da mente, da abnegação de si mesmo e do livre exercício da caridade. Por isso, o cristão adulto implora do Espírito divino a graça da sincera abnegação, humildade e mansidão em servir, e da fraterna generosidade para com os outros.
O Concílio Ecuménico Vaticano II exortava os crentes, dizendo que «tanto melhor promoverão e até realizarão a união dos cristãos quanto mais se esforçarem por levar uma vida mais pura, de acordo com o Evangelho. Porque, quanto mais unidos estiverem em comunhão estreita com o Pai, o Verbo e o Espírito, tanto mais íntima e facilmente conseguirão aumentar a fraternidade mútua» (UR 7).
Contudo, o ecumenismo e o diálogo inter-religioso não parte do princípio de que todas as opções religiosas são iguais e de que, acreditando que todas as pessoas de boa vontade se salvem pela misericórdia de Deus, todas as opções são iguais e que haveria que encontrar uma religião universal que englobe toda a Humanidade.

O diálogo como testemunho da Verdade
O cristão adulto sabe que só Jesus Cristo é o autêntico e único Salvador, que nos conduz à verdadeira fé, à fé plena, à autêntica verdade sobre Deus.
Assim, um cristão que se esforça pelo diálogo fá-lo a partir de alguns pressupostos básicos:
– sabe que a fé não é apenas uma relação individual ou individualista com Deus, é também a inserção na Comunidade dos crentes, na Igreja de Jesus Cristo, espaço onde se recebe, cresce e vive a fé;
– embora a fé cristã pressuponha um certo conhecimento é mais do que isso, é o acolher Jesus na vida, é o entregar a uma comunhão com Ele e, por Ele, a toda a Humanidade;
– a fé cristã é também histórica, isto é, Deus revelou-se na história da Humanidade, por diversas etapas, é na história que a pessoa escuta Deus e lhe responde e, por último, é na história pessoal de cada um que se vai experimentando, de forma imperfeita, a salvação que esperamos viver plenamente quando o tempo e o espaço já não tiverem influência sobre nós;
– a fé, por comunhão com o Deus Trino, é um estado sempre inacabado porque o Deus Amor permite sempre uma maior inserção no Seu Mistério, por isso é vivência da autêntica fé, a fé cristã, é sempre um mistério inesgotável.
No diálogo com as outras opções espirituais, o cristão adulto não esquece que vive a fé englobando a sua inteligência, afecto e vontade, por isso uma fé profundamente humana. Fé essa que engloba a totalidade da pessoa, com tudo que isso implica. A sua fé é um dom de Deus, que se procura diariamente aprofundar e cultivar.
Por isso, o diálogo não é para ‘ganhar’ novos adeptos, nem para ‘vencer o inimigo’, é antes uma consequência de se ter descoberto o Verdadeiro Deus, que é a Verdade, e a necessidade de O anunciar, tornando-o presente através da nossa acção.

Natal!

O Natal parece cada vez mais uma palavra escrita na água.
Mas os tempos de crise são, também, o tempo favorável para os contos de fadas, para o regresso ao artesanato de viver, para a atenção. E a atenção é o único caminho para o inexprimível, a única via para o mistério.
O Natal é, assim, aquela época da beleza em fuga, da graça e do mistério prestes a desaparecer e que, por isso mesmo, certos homens nunca renunciam…

PowerPoint’s úteis!?!?

O recurso às novas tecnologias tem sido, nos últimos tempos, um excelente contributo para dinamizar a acção de catequizar, nomeadamente na formação de catequistas.
As suas virtualidades e potencialidades são por demais evidentes. Um bom uso do PowerPoint faz com que a comunicação a realizar se torne mais clara e o fio condutor mais e perceptível.
Contudo, tem-se vindo a observar uma dificuldade que eu sintetizaria nesta frase: quando tenho pouco a dizer, exagero no aspecto gráfico.
Pelo que uma boa apresentação começa sempre por um sintetizar de ideias e conteúdos a transmitir, que depois coloco na apresentação. Nunca se fará uma boa formação, e muito menos catequese, se pego numa aplicação de PowerPoint e me limito a lê-la. Ou, pior a ianda, a ler uma aplicação que eu não fiz.

É com esta ressalva que partilho alguns link’s que têm aplicações muito completas.
Cabe a cada um de nós ver, utilizar o que nos serve. Mas quando apresentarmos que seja uma aplicação que já a fizemos nossa.

https://inicteol2.googlepages.com/60aulas
https://inicteol2.googlepages.com/catequese-infantil
https://klappiquiz.googlepages.com/

Estes link’s estão divulgados na página: https://www.montemuro.org/portal/

Cristão Adulto – IX

Homem e Mulher, Deus os criou!

Depois de ter abordado alguns aspectos, que eu considero fundamentais para que um cristão se possa considerar adulto, vou debruçar-me sobre aspectos, aparentemente de fronteira. Daqueles que podem fazer a qualidade de uma vida cristã e que são, a maior parte das vezes, descuidados por se considerarem assumidos à partida. E não é bem assim.
Começo por me referir ao lugar da mulher na vida cristã, e faço-o pela mão do Mestre. De facto, Jesus, num ambiente tremendamente patriarcal, age com as mulheres de modo diferente.

Mulher marginalizadaAs senhoras estavam marginalizadas em, pelo menos, três âmbitos: sexual, social e religioso.
No âmbito sexual, e por causa das normas de pureza, as mulheres estavam muitas vezes marginalizadas da restante comunidade – sobretudo religiosa –, o que provocaria graves danos na auto-estima e realização de cada uma delas. Mas Jesus age de modo diferente: admite-as como discípulas (Lc 8,1-3); fala com elas em público (Jo 4, 27); e num grande desafio aos preceitos do seu tempo restitui dignidade ao funcionamento corporal feminino, veja-se o caso da hemorroísa (Mc 5, 21-43).
A marginalização social da mulher empurrava a mulher para dentro de casa, para as lides domésticas, retirando-lhes responsabilidades sociais, políticas, jurídicas e religiosas. Jesus, por seu turno, reage tratando cada mulher como pessoa de facto, em igualdade com o varão. Veja-se o caso dos paralelismos nas parábolas: a mulher introduz o fermento na farinha (Mt 13,33) o varão semeia o grão de mostarda (Mt 13, 18-19); ou então o amigo inoportuno que pede pão durante a noite (Lc 11, 5-8) que corresponde com a viúva impertinente que pede ao juiz que se faça justiça (Lc 18, 1-8). A maneira de Jesus entender a actividade feminina iguala-a com a do varão. Jesus transforma as mulheres nas primeiras testemunhas da ressurreição, desafiando, assim, a concepção segundo a qual a mulher não era capaz de dar testemunho válido (Mc 16,7).
A nível religioso, a mulher estava secundarizada: não tinha acesso ao estudo da Torah, nem ao Templo e nem às outras realidades religiosas. As inúmeras prescrições legais de pureza ritual pelas quais tinha de passar dificultava-lhe ainda mais a sua realização como sujeito religioso adulto de pleno direito. Mas Jesus com as suas palavras e gestos erradica estas situações de injustiça. As mulheres participam no Reino de Deus em igualdade de condições com o varão. Veja-se o paralelismo da confissão de fé entre Marta (Jo 11,27) e Pedro (Jo 6, 69). Os textos pascais dão testemunho desta igualdade entre as mulheres e os varões, pois estão presentes nos momentos mais densos. É uma mulher que unge Cristo como profeta em Betânia (Mc 14, 3-9), são as mulheres que estão no lugar da Morte de Jesus Cristo (Mc 15, 40-41) e no Evangelho segundo São Marcos vê-se claramente a vinculação das mulheres ao discipulado e seguimento de Jesus, e são elas que primeiro dão testemunho da Ressurreição de Jesus.
No fundo, a síntese está em São Paulo quando diz: “Não há judeu nem grego; não há escravo nem livre; não há homem e mulher, porque todos sois um só em Cristo Jesus. E se sois de Cristo, sois então descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa” (Gl 8, 28).

Complementaridade imprescindível
Chegados aqui, vemos que a complementaridade entre os dois géneros é o único caminho a seguir, sem qualquer subjugação ou subordinação.
Contudo, na história da Igreja, no seu esforço de realização histórica do projecto de Deus, nem sempre foi assim, porque o esforço de institucionalização esclesiástico levou a que se esquecessem algumas das realidades acima referidas. As necessidades de adaptação ao meio cultural envolvente prevaleceram para que sobrevivessem a disciplina e a boa ordem. Cada pessoa é fruto também do seu tempo… E hoje podemos dizer com convicção que a mulher precisa de ser mais reconhecida e valorizada dentro da nossa sociedade e também dentro da Comunidade eclesial.
Considero que a Igreja ficou privada de uma dimensão muito importante – a dimensão feminina – que empobrece a sua mediação histórica de Corpo de Cristo, porque se não contar com a presença de todos os fiéis, vê-se incompleta na sua missão.

Que as falsas imagens de Deus e a má compreensão da relação entre mulher e varão, juntamente com o nosso pecado, não nos continue a impedir de ver com clareza a beleza da Criação: “Deus criou o ser humano à sua imagem, criou-o à imagem de Deus; Ele os criou homem e mulher” (Gn 1,27).

Cristão Adulto – VIII

Novos movimentos eclesiais

Uma das características de um cristão adulto é a sua capacidade de se relacionar com os «novos movimentos eclesiais», de os respeitar e considerar, ou então de fazer parte de um deles, recebendo daí o acompanhamento necessário para ser um cristão maduro.
Estes movimentos chamam-se ‘novos’ para diferenciá-los de qualquer outra forma de associação laical e denominam-se ‘movimentos’, porque são uma expressão profunda do movimento eclesial, da Igreja movimento, mais do que uma actividade. São ‘eclesiais’ porque podem pertencer a eles cristãos provenientes das três vocações: leigos, consagrados e ordenados. Se bem que na sua grande maioria estão compostos por cristão leigos.

Identidade dos novos movimentos eclesiais
Estes movimentos são considerados como verdadeiros carismas do Espírito para o tempo presente. Têm a característica de estarem dotados de uma certa imprevisibilidade, mutabilidade, assombro, profunda novidade, gratuidade e liberdade. Não podia ser de outra forma, ao serem expressão da acção do Espírito Santo na Igreja.
Cada crente, ao contactar com esta realidade, procurará que se verifiquem, com qualidade e coerência, as seguintes características:
– Que sejam realidades eclesiais novas, preferentemente laicais, diferentes das precedentes ou contemporâneas associações laicais;
– De origem carismática, pois pertencem à vida e dinamismo da Igreja, não à sua estrutura ou dimensão institucional. Não vêm dadas, surgem inesperadamente conforme a liberdade e a imprevisibilidade do Espírito Santo;
– Com um forte impulso missionário numa sociedade secularizada. Têm como tarefa principal a missão no mundo, no qual se situam como testemunhas daqueles valores cristãos que o vendaval secularista arrasou;
– Nascidas em torno de um fundador, que é caminho para Cristo, embora tenha forte personalidade carismática, que exerce uma forte atracção, testemunha privilegiado da fé, com uma oferta atraente e significativa, porque pessoa do Espírito;
– Com uma doutrina, espiritualidade e metodologias próprias, inseridas dentro do grande tesouro que é a Igreja, mas concretizadas e com um toque especial e específico;
– Vivem o acontecimento cristão de modo excepcional. A grande novidade destes movimentos está na recuperação daquelas formas de ser cristão que foram esquecidas pela grande massa de cristãos. Tratam de encarnar na vida a Jesus Cristo, o Senhor, e de testemunhá-Lo desde essa experiência vital;
– Que viva no aqui e agora da Igreja. O rasgo mais característico destes movimentos é que vivem muito encarnados no tempo presente, com uma forte comunhão teológica, afectiva e efectiva com os Pastores, de modo especial com o Papa;
– Empenhados numa nova evangelização. O estar decididos a desempenhar tarefas de nova evangelização deriva do seu encontro existencial com o acontecimento Jesus Cristo, em comunhão com a Igreja.

Dito de outro modo, os novos movimentos são realidades eclesiais, preferentemente laicais, de origem carismática, e com um forte impulso missionário, no seio de uma sociedade secularizada. Nasceram de um fundador com grande personalidade carismática e têm espiritualidade e metodologias específicas. No seu agir, vivem de maneira excepcional o acontecimento originante: Jesus Cristo, empenhados, em Igreja, em anunciá-Lo aqui e agora.

Multiplicidade na Unidade
Perante este fenómeno dos novos movimentos eclesiais e da sua fecunda proliferação pela Igreja universal, podemos afirmar, com João Paulo II, que só é admissível aquela pluralidade que constitui «um hino à unidade».
Este princípio de unidade, que se deve sempre salvaguardar, e que deriva da comunhão na mesma fé, esperança e caridade, obedientes a Cristo e aos Pastores da Igreja; ou seja, pela comunhão no ser e no fazer da Igreja. Está é, indubitavelmente, a melhor chave de classificação dos movimentos e da maturidade dos seus membros.

Como eu vejo a Catequese em Portugal, hoje


Pedra Filosofal

Eles não sabem que o sonho
é uma constante da vida
tão concreta e definida
como outra coisa qualquer,
como esta pedra cinzenta
em que me sento e descanso,
como este ribeiro manso
em serenos sobressaltos,
como estes pinheiros altos
que em verde e oiro se agitam,
como estas aves que gritam
em bebedeiras de azul.

eles não sabem que o sonho
é vinho, é espuma, é fermento,
bichinho álacre e sedento,
de focinho pontiagudo,
que fossa através de tudo
num perpétuo movimento.

Eles não sabem que o sonho
é tela, é cor, é pincel,
base, fuste, capitel,
arco em ogiva, vitral,
pináculo de catedral,
contraponto, sinfonia,
máscara grega, magia,
que é retorta de alquimista,
mapa do mundo distante,
rosa-dos-ventos, Infante,
caravela quinhentista,
que é cabo da Boa Esperança,
ouro, canela, marfim,
florete de espadachim,
bastidor, passo de dança,
Colombina e Arlequim,
passarola voadora,
pára-raios, locomotiva,
barco de proa festiva,
alto-forno, geradora,
cisão do átomo, radar,
ultra-som, televisão,
desembarque em foguetão
na superfície lunar.

Eles não sabem, nem sonham,
que o sonho comanda a vida,
que sempre que um homem sonha
o mundo pula e avança
como bola colorida
entre as mãos de uma criança.

António Gedeão, in Movimento Perpétuo, 1956

Cristão Adulto – VII

Uma espiritualidade saudável

A vida espiritual de um cristão adulto é o que permite uma vida com sentido, que lhe permite responder às questões fundamentais: quem sou?, de onde venho?, para onde vou?, para quê viver? A espiritualidade permite a cada ser humano ver para além de si mesmo, é a capacidade de transcendência, de ter esperança, de abertura ao futuro e consciência da própria finitude.
As necessidades de ordem espiritual emergem da interioridade da pessoa, embora se articulem em cada contexto de acordo coma cultura e as tradições do lugar onde a pessoa se encontra. Num mundo plural, onde nada aparece como absoluto, o cristão deverá ser capaz de zelar pela sua saúde espiritual, para obter uma vida com qualidade.
De seguida descrevo algumas características de uma espiritualidade saudável.

Mistagógica e não moralizante
Diz-se que uma espiritualidade é mistagógica quando introduz ou inicia o indivíduo no mistério de Deus e no mistério da pessoa. Tem por objectivo as experiências da vida espiritual, dom incomparável de Deus. Toda a prática ascética tem como finalidade remover do caminho humano tudo aquilo que impede a comunhão e intimidade pela com Deus.
Por seu turno, uma espiritualidade moralizante vê como principal objectivo evitar as faltas e os pecados. Parte do ideal de perfeição moral e está em permanente perigo de criar escrúpulos de consciência. Um erro, muito comum, é equiparar fé e moral.

Libertadora e não asfixiante
Uma espiritualidade que queira ser de seguimento de Jesus Cristo tem de tender necessariamente para a introdução de cada ser humano numa vivência de Liberdade: a liberdade dos filhos de Deus.
A liberdade interior, que se consegue por uma ascese espiritual, é o único local onde se consegue o encontro profundo com Deus e a libertação dos factores exteriores condicionantes, nomeadamente as expectativas e exigências que são impostas.

Criadora de unidade e não de divisão
Uma espiritualidade saudável implica também que, na relação com os outros, haja sentimentos fraternos. O indivíduo sente-se profundamente unido a cada ser humano: nas suas limitações e fragilidades, e no desejo de salvação.
Quando a «espiritualidade» de um cristão o leva a classificar as pessoas em crentes e não crentes, entre ortodoxos e hereges, entre piedosos e depravados, entre bons e maus, está a dar uma mostra clara de que a sua espiritualidade ainda não atingiu a fase adulta.
Uma espiritualidade de unidade valoriza o sentido das relações interpessoais. A vida espiritual saudável precisa de boas relações humanas, cordiais, relaxadas, nas quais se possa dedicar aos outros o próprio tempo. Amizades autênticas e profundas fertilizam a vida espiritual.

Encarnada e não separada da realidade
Uma espiritualidade sã capacita a pessoa para, diariamente, fazer bem as suas coisas, superando as dificuldades inevitáveis do trabalho e do contexto social.
Um cristão que procura, permanentemente, na sua espiritualidade uma forma de fugir da sua vida diária ainda não atingiu a vida adulta da fé. Pois uma espiritualidade adulta capacita o cristão para dizer sim às suas ocupações diárias que Deus lhe propõe e que ele discerne à luz do Espírito.

Procura Deus e nãos os seus consolos
O cultivar a vida espiritual tem como objectivo ter experiências espirituais. Mas há o perigo de se ficar pelas vivências e sentimentos, que acabam por ser o mais importante, relegando a questão do sentido – e Deus – para um segundo lugar.
As experiências isoladas nada dizem da qualidade da vida espiritual. Esta demonstra-se no caminho do amor dado e recebido nas interligações fraternas, e consequente compromisso, onde Deus está presente e se manifesta.

Global e não parcelar
Uma espiritualidade adulta contempla a totalidade da pessoa, toas as suas dimensões: entendimento e vontade, coração e sentimentos, espírito e corpo, consciente e inconsciente – tudo é abrangido pela vida espiritual.

Humilde e não orgulhosa
A humildade é um excelente critério para discernir se uma vida espiritual é ou não adulta, pois “a humildade nada mais é do que a caminhada para a verdade”(Santa Teresa de Jesus).

Por uma nova catequese

Na Semana da Educação Cristã, um olhar sobre o que pode mudar nesta área

Para quem se compromete em Igreja, ao serviço da Catequese, como consequência da sua opção baptismal tem, na minha opinião, nos novos materiais catequéticos editados pelo Secretariado Nacional da Educação Cristã uma excelente oportunidade para centrar a sua missão naquilo que a catequese deve ser: o ecoar da voz de Deus no coração de cada pessoa que decidiu aderir a Jesus Cristo, no seio da comunidade eclesial.
Estes materiais catequéticos foram vistos, e ainda o são, por muitos agentes da pastoral catequética como uma espécie de tábua de salvação. Ou seja, as dificuldades e obstáculos que todos temos em transmitir ou suscitar a fé ficariam resolvidos com uns novos guias e livro do catequizando, bem elaborados, bem feitos, adaptados aos dias de hoje, recorrendo às novas tecnologias… eu sei lá! Mas como essa solução geral não acontece, porque não podemos pedir a um material o que ele não pode dar, espero que seja uma ocasião para relermos o documento de referência para a catequese em Portugal e onde os nossos Bispos nos dizem o que deve ser a Catequese.
No último capítulo do “Para que Acreditem e Tenham Vida” diz-se claramente que os materiais são insuficientes. Para suscitar e transmitir a fé tem que se ter em conta também: o testemunho da Igreja, que se torna preferencialmente visível no exemplo de vida cristã da família e da comunidade local; o acompanhamento pessoal do percurso de fé de cada catequizando; a capacidade que o catequista tem de comunicar com o catequizando, entre outras. Mas, acima de tudo, a grande certeza que é a comunidade cristã e o catequista, como seu enviado, que dão vida à catequese.

Oportunidade para tomar consciência
Os novos materiais podem ser – e é assim que eu os vejo – um excelente catalisador positivo para desenvolver em cada comunidade uma maior consciência da sua responsabilidade na missão de catequizar, porque a solução última não está nos materiais, nem em qualquer meio material, mas sim na Comunidade que, animada pelo Espírito Santo vive e, por isso, transmite a fé. Pede a alguns dos seus membros que sejamos acompanhantes daqueles que tendo descoberto a beleza de Deus querem aderir a Ele, através de um itinerário de inspiração catecumenal, ajudados pela graça de Deus, pelo apoio da comunidade e acompanhados pessoalmente pelo catequista, rosto e porta-vos da fé da Igreja.

Ora, a paulatina publicação da revisão dos materiais pode ser uma oportunidade para aqueles que temos alguma responsabilidade nesta área fazermos mais e melhor o que nos compete, que a Igreja nos confiou:
– Como seria bom que cada catequista se sentisse mais comprometido com o seu ser Igreja e procurasse aprofundar a sua vocação baptismal!
– Como seria bom que cada serviço diocesano de catequese proporcionasse aos seus catequistas uma excelente proposta formativa que os ajudasse a serem melhores catequistas, aceitando as suas qualidades e capacidades, potenciando-as ao serviço da transmissão da fé!
– Como seria bom que cada comunidade, através de todos os seus membros, se sentisse verdadeiramente responsabilizada pela transmissão da fé e de gerar novos filhos no Filho, pela celebração dos Sacramentos de Iniciação cristã, sabendo que na medida que inicia ela mesma aprofunda a sua vivência e fidelidade ao Evangelho!
– Como seria bom que as diversas famílias religiosas e de espiritualidade pudessem dar o seu contributo neste momento da evangelização, que é a etapa catequética, aportando aquilo que têm de melhor!

Oportunidade para agir


Penso, muito sinceramente, que esta etapa da publicação dos materiais de catequese pode ser, e é, uma etapa de graça para a Igreja em Portugal, porque nos ajuda a todos a centrar a atenção na catequese e na sua importância para a vida eclesial. Permite-nos tomar consciência dos nossos limites e a ser criativos, na fidelidade ao Espírito, para superar as limitações presentes.
É uma oportunidade para vermos que só os materiais não são suficientes – por muito bons que eles sejam –, que há outros recursos a ter em conta e que, bem vistas as coisas, os materiais didácticos em todo o processo da catequese, não são a coisa mais importante, embora sejam imprescindíveis.

Contando com bons catequistas

Mas acima de tudo ajuda a dignificar e responsabilizar a figura do Catequista, um autêntico ministério eclesial que urge ser valorizado através da promoção da vocação de catequista, com processos de discernimento e convocatória bem estruturados. Através da elaboração de percursos formativos apropriados e coerentes entre si, com elaboração de linhas orientadoras para a sua missão de co-responsabilização eclesial e expressão privilegiada daquilo que a Igreja pode e deve esperar dos leigos comprometidos e capazes que, em parceria com os seus pastores, se dão a Deus na catequese.

Para uma Igreja evangelizada e evangelizadora

Para terminar, considero que esta publicação dos novos materiais, ou da revisão dos materiais didácticos, ou os «novos catecismos» – o nome é de somenos – está a ser uma boa oportunidade para todos nos questionarmos, vermos o nosso lugar na missão de catequizar, e assumirmos as nossas responsabilidades, sabendo que é a Igreja quem evangeliza, na qual todos somos imprescindíveis.

P. Luís Miguel Figueiredo Rodrigues, Arquidiocese de Braga

Deve ser horrível ser Deus

Já pensaram na pachorra que é preciso para ser Deus? Lidar com toda a humanidade ao mesmo tempo deve ser horrível. É que Deus tem de conviver com todo o tipo de pessoas. Neste caso é mesmo todo o tipo de pessoas. Não há dúvida que Deus tem de ser Deus só para conseguir suportar ser Deus.
Ser Deus é ser incompreendido. Não existe nada no mundo tão evidente, tão visível, tão compreensível como Deus. Deus, porque é Deus, resplandece em tudo. Por isso, a existência de Deus é uma das certezas mais consensuais da humanidade. No entanto Deus está também acima de tudo, infinitamente acima de tudo. Claro que Deus sabe que as suas criaturas nunca O conseguirão compreender. O problema não está aí, mas na forma como as criaturas lidam com o que não entendem.
Muitos não Lhe ligam nenhuma. Aproveitam tudo o que Ele lhes dá, sem sequer uma palavrinha para agradecer aquilo que, afinal, é tudo o que eles têm e são. Por vezes até exigem mais, invocando direitos inalienáveis. Se Deus não existisse como podiam existir direitos? Como podia existir quem os invoque? Alguém fala dos direitos de Deus?
Aqueles que acham que compreendem Deus às vezes ainda são piores. Que piegas e pedinchões! Como acham que compreendem, fazem contratos com Deus, chantagem com Deus, tentam enganar Deus, seduzir Deus, manipular Deus. Mais, como se consideram relacionados a alto nível, acham-se com direito a uma vidinha melhor. Melhor do que quê? Se é assim, porque não pedir asas ou visão raio-x?
Não é extraordinário que Deus tenha feito o universo e depois essa obra se ponha a comentar o que Ele fez e o que ela é? Temos mil críticas à forma como o mundo funciona. Como se houvesse alternativa e não fosse um privilégio indiscritível simplesmente existirmos. Nós somos os que conseguiram convite para participar neste momento e neste cantinho da Criação. Lamentar o mundo e a sociedade, desdenhar da obra e Autor é, senão grosseria, pelo menos tolice.
A mais bela criatura de Deus é a liberdade humana, e é essa que gera mais problemas. Deus criou a liberdade da forma mais radical, recuando para deixar outros fazer. Se a liberdade humana avançar para Deus consegue realizar obras espantosas. Menos perfeitas que as Deus faria sozinho, mas muito mais valiosas por serem feitas por quem não é capaz.
O risco da liberdade é que pode ser usada como se quiser. Uma liberdade sem Deus é destruição, mas isso faz parte da liberdade. O mais incrível é muitos usarem esse mal que a liberdade humana faz sem Deus como prova da inexistência de Deus. Como existe mal no mundo, que nós fizemos, então não pode existir um Deus bom, que nos fez a nós. Eu estraguei e por isso Ele não existe! Não é espantoso o raciocínio?
Talvez o mais ridículo seja nós orgulharmos daquilo que Deus fez através de nós. Alguém que não é nada senão aquilo que Deus fez, que depois teve de ser corrigido porque já estragara o que era, e que só conseguiu fazer algo de bom porque Deus lhe segurou a mão, anda todo inchado com essa sua realização! E nós todos dizemos «que grande artista!», «que genial autor!», «que excelente artigo!», sem percebermos que o verdadeiro Artista e Autor é aquele que merece palmas cada vez que passa uma mosca.
Ser Deus é tão horrível que, se Ele viesse a este mundo, as coisas iam correr mal de certeza. É verdade que os gregos, romanos e outros imaginaram como seriam as visitas dos deuses, mas eles perceberam tudo ao contrário, descrevendo a cena como um patrão a visitar a propriedade. O que aconteceria realmente seria que, depois de um momento de euforia no reconhecimento, começariam as reinvindicações, as discussões, os ataques. Não! Se Deus nos visitasse, o mais certo era Ele acabar morto da forma mais cruel que se conseguisse encontrar.
Deve ser horrível ser Deus. Afinal quem é que quereria ser Deus, para ter tanto trabalho, fazer tudo tão bem, tão perfeito e depois acabar esquecido, desprezado, incompreendido? Tem de se ser especial para se aceitar ser Deus. De facto só o Amor quereria e poderia ser Deus.

João César das Neves
Professor universitário
naohaalmocosgratis@fcee.ucp.pt

Cristão Adulto – VI

Um cristão praticante

É óbvio demais para se dizer: um cristão adulto é um cristão praticante! Tem de o ser.
E o que é praticar? Literalmente, é exercer, pôr em prática. A prática cristã consiste em pôr em circulação os dons recebidos, em favor da comunidade, dos irmãos. Não é critério suficiente o cumprimento do preceito dominical e demais deveres estipulados. Embora estes preceitos tenham o seu papel imprescindível, pois concentram no essencial e dão força para viver essa nova vida experimentada e saboreada: a comunhão com Deus.

Praticar implica

Praticar implica participar na celebração da Eucaristia dominical: alimentar-se com a Palavra e com o Pão da Vida, reunir-se com os irmãos da Comunidade. Aí o encontro com o Ressuscitado implica necessariamente na «missa», no envio, na missão. Pois a eucaristia como «fonte e cume de toda a vida cristã» é comunhão de vida com Deus e unidade do povo de Deus, pelas quais a Igreja é o que é, são significadas e realizadas pela Eucaristia (cf. CCE 1325).
Praticar implica a confissão sacramental, sempre que necessário, mas pelo menos uma vez por ano. Confessar-se é um acto extremamente pessoal e nada rotineiro, que um cristão adulto percebe que se o faz com sinceridade e autenticidade de arrependimento, e firme propósito de conversão sente em si os frutos da graça que perdoa. Exemplo dessa graça é a alegria do regresso do filho pródigo. Por esta prática, o cristão reconcilia-se com Deus e restabelece a comunhão plena que o pecado tinha debilitado. Reconcilia-se também com os irmãos, a quem o pecado tinha espiritualmente afectado, debilitando a comunhão fraterna.
Praticar implica viver ao ritmo do ano litúrgico. A comemoração cíclica dos acontecimentos sagrados, o memorial das maravilhas de Deus, faz com que o cristão celebre no hoje da sua história os grandes acontecimentos salvíficos de Deus em favor do Seu povo, o assuma como seus e os expresse no seu quotidiano, fazendo do ano litúrgico o seu itinerário espiritual, porque o ano litúrgico “é o desenrolar dos diferentes aspectos do único mistério pascal. Isto vale particularmente para o ciclo das festas em torno do mistério da Encarnação (Anunciação, Natal, Epifania), que comemoram o princípio da nossa salvação e nos comunicam as primícias do mistério da Páscoa” (CCE 1171).
Praticar implica entender a existência à luz de Deus, quando caminha ao lado do Ressuscitado e não se limita aos caminhos já percorridos e pré-estabelecidos, geradores de seguranças, mas curtos, muitas vezes no seu alcance. Quando solta as amarras do egoísmo e decide a percorrer caminhos não andados, desconhecidos, na sua existência, está a praticar a sua fé. Choca com os seus limites, sente-se impotente, decepciona-se de si e das suas coisas. Mas no meio da provação e da dor é capaz de gritar com convicção: Deus ama-me.

Mas é missionária
A prática cristã fica assim entrelaçada com a totalidade da vida do cristão. É um encontro permanente entre Deus e o crente, uma vida feita comunhão. O cristão encontra Deus na Palavra e nos Sacramentos, para continuar a encontrá-Lo mais apaixonadamente aí onde Ele não está e onde a Igreja o deve tornar presente; ou de uma forma mais precisa, onde está oculto e quer ser encontrado.
O cristão adulto vive o mandato do Senhor:
“Foi-me dado todo o poder no Céu e na Terra.
Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos, baptizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos tenho mandado. E sabei que Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos”(Mt 28, 19-20).