Movimentos Eclesiais e Catequese – IV

Perante este fenómeno dos novos movimentos eclesiais e das novas comunidades, e da sua fecunda proliferação pela Igreja universal, podemos afirmar, com João Paulo II, que só é admissível aquela pluralidade que constitui «um hino à unidade».
Este princípio de unidade, que se deve sempre salvaguardar, e que deriva da comunhão na mesma fé, esperança e caridade, obedientes a Cristo e aos Pastores da Igreja; ou seja, pela comunhão no ser e no fazer da Igreja. Está é, indubitavelmente, a melhor chave de classificação dos movimentos, de entre as muitas que se poderia optar.

Objectivos e metodologia
Podemos desde já dizer que todos os movimentos coincidem nos objectivos gerais, que são a vivência experiencial da fé, a vivência em comunidade e o carisma dos seus fundadores. Isto tem como consequência que todos se esforcem por viver a perfeição da caridade, por construir a Igreja no tempo presente, edificando um mundo novo.
Depois, cada movimento, tem a sua peculiaridade, a sua forma específica de realizar estes objectivos. O que distingue um movimento do outro é a forma como cada um realiza os objectivos gerais, como os consegue concretizar.
No que diz respeito ao método, temos de ver que a essência do cristianismo é o acontecimento Cristo e a Sua Igreja: Cristo é o acontecimento original e a Igreja é a sua continuação no espaço e no tempo. O que os novos movimentos pretendem com os seus métodos é possibilitar o encontro com esse Acontecimento.
Se fosse preciso catalogar a metodologia seria catalogada como metodologia do encontro com Cristo, onde tudo o mais perde importância e é relativizado, procurando cada um viver o cristianismo na sua primeiríssima novidade.

Os principais passos desta metodologia são:
– encontro com o Senhor;
– deixar-se olhar pelo Senhor, e reconhecê-lo como Deus e Senhor;
– seguir a Cristo em radicalidade;
– num esforço missionário.
Se repararmos foi esta a metodologia que Cristo utilizou com os seus discípulos.

Movimentos Eclesiais e Catequese – III

Este fenómeno de renovação das novas comunidades tem a sua origem no Concílio Vaticano II, que vê na experiência comunitária da Igreja primitiva o modelo e a chave da renovação eclesial, uma vez que as novas comunidades são aqueles lugares nos quais se tem a satisfação de se encontrar, saudar, aceitar e viver como irmãos em Cristo. Para que sejam realmente comunidades eclesiais, Paulo VI na Evangelii nuntiandi, afirma que devem viver alimentadas pela Palavra, unidas à Igreja particular e universal, em comunhão com os seus pastores e comprometidos com o meio. Não devem ser sectárias, devem afastar toda a contestação sistemática e um espírito hiper-crítico.
Esta realidade das novas comunidades não surge por acaso, fundamenta-se em raízes antropológicas, teológicas, eclesiológicas e na Palavra de Deus.

Deste modo:

Fundamento antropológico. O homem, desde as suas origens, foge da solidão essencialmente porque tem necessidade de intercâmbios e de sociabilidade;

Fundamento teológico. Deus é um ser pessoal e comunitário, pelo que as novas comunidades, encarnadas nas realidades terrenas, oferecem ao homem e à sociedade o Cristo pascal, e ao realizar-se nelas o prodígio permanente do Pentecostes, contagiam a unidade e a fraternidade universais;

Fundamento eclesiológico. A Igreja é a realização visível e misteriosa na terra da comunhão trinitária. É, em Cristo, sinal e instrumento da unidade de todo o género humano e da união de todos os homens entre si e com Deus. A Trindade vive na terra, mediante o seu sinal, o seu sacramento, que é a Igreja;

Fundamento bíblico. Jesus teve claramente a vontade de fazer comunidade. A sua mensagem é claramente comunitária. Veio ao mundo para instaurar o Reino no qual se fizeram reais a paternidade de Deus e a fraternidade universal.

Como conclusão, podemos dizer que estas novas comunidades cristãs podem definir-se como um grupo de cristãos em comunhão eclesial, que partilham o que são, o que têm e o que fazem. Celebram e crescem na fé, abertos à missão, fundamentados no amor, vínculo que os une numa organização evangélica.

Movimentos Eclesiais e Catequese – II

Denominam-se «movimentos», porque são uma expressão profunda do movimento eclesial, da Igreja movimento, mais do que uma actividade.
São «eclesiais» porque podem pertencer a eles cristãos provenientes das três vocações: leigos, consagrados e ordenados. Se bem que na sua grande maioria estão compostos por cristão leigos.

Identidade dos novos movimentos eclesiais
Estes movimentos são considerados como verdadeiros carismas do Espírito para o tempo presente. Têm a característica de estarem dotados de uma certa imprevisibilidade, mutabilidade, assombro, profunda novidade, gratuidade e liberdade. Não podia ser de outra forma, ao serem expressão da acção do Espírito Santo na Igreja.
Todos os novos movimentos eclesiais parecem coincidir nas seguintes características:

São realidades eclesiais novas, preferentemente laicais, diferentes das precedentes ou contemporâneas associações laicais;

De origem carismática, pois pertencem à vida e dinamismo da Igreja, não à sua estrutura ou dimensão institucional. Não vêm dadas, surgem inesperadamente conforme a liberdade e a imprevisibilidade do Espírito Santo;

Com um forte impulso missionário numa sociedade secularizada. Têm como tarefa principal a missão no mundo, no qual se situam como testemunhas daqueles valores cristãos que o vendaval secularista arrasou;

Nascidas em torno de um fundador, de forte personalidade carismática, que exerce uma forte atracção, testemunha privilegiado da fé, com uma oferta atraente e significativa, porque pessoa do Espírito;

Com uma espiritualidade e metodologias próprias, inseridas dentro do grande tesouro que é a Igreja, mas concretizadas e com um toque especial, específico;

Vivem o acontecimento cristão de modo excepcional. A grande novidade destes movimentos está na recuperação daquelas formas de ser cristão que foram esquecidas pela grande massa de cristãos. Tratam de encarnar na vida a Jesus Cristo, o Senhor, e de testemunhá-Lo desde essa experiência vital;

Vivem no aqui e agora da Igreja. O rasgo mais característico destes movimentos é que vivem muito encarnados no tempo presente, com uma forte comunhão teológica, afectiva e efectiva com a Hierarquia, de modo especial com o Papa;

Empenhados numa nova evangelização. O estar decididos a desempenhar tarefas de nova evangelização deriva do seu encontro existencial com o acontecimento Jesus Cristo, em comunhão com a Igreja.

Image hosted by Photobucket.com

Movimentos Eclesiais e Catequese – I

É um dado claro, para quem vê a Teologia pós conciliar, que a perda de unidade da teologia é um dos maiores desafios que se coloca hoje ao pensamento cristão. Le Guillou tenta dar resposta a esta situação, propõe uma teologia do Mistério, capaz de devolver uma reflexão crítica e sistemática no horizonte onde o cristianismo nasceu: a recepção da Verdade revelada na história. A categoria de Mistério permite à reflexão teológica encontrar a unidade e o equilíbrio na confissão do cristocentrismo trinitário, capaz de inspirar uma acção verdadeiramente missionária e pastoral da Igreja. Esta é a verdadeira confissão apostólica.
O teólogo acima citado, escreve no seu livro O Mistério do Pai, em 1973, que «o certo é que a fidelidade ao testemunho trinitário que está presente no coração da Igreja e a congrega na unidade, é o que suscitou ao longo de séculos as comunidades de vida monástica e de vida apostólica nas quais germinou, apoiando-se, uma sobre a outra, a experiência pastoral e o aprofundamento teológico. Nos nossos dias, tal como no passado, há-se ser nestas comunidades onde a fé e a teologia se hão-de restaurar nos seus verdadeiros fundamentos. Mas, no futuro – continua Le Guillou -, será na comunicação de comunidades espirituais livres – que agrupem na vida do Espírito a homens e mulheres, sacerdotes, religiosos e leigos – onde se desenvolverão os caminhos de uma renovação espiritual, teológica e missionária, digna do chamamento profético do Vaticano II». Eu vejo aqui uma clara aposta nos Novos Movimentos Eclesiais, e no contributo que são chamados a dar à Igreja, onde todos os aspectos e perspectivas da Igreja devem ser vistos desde o prisma do Mistério Trinitário.
Estas novas organizações de apostolado secular, excepcionalmente dinâmicas, às quais se referia o Papa no ano de 1979, chegariam a ser denominadas pelo termo genérico de «movimentos», expressão que nem o Vaticano II nem o Código de Direito Canónico empregam ao referir aos cristãos leigos, pois falam mais de associações seculares. João Paulo II utilizou-a em 1981, referindo-se aos novos movimentos na Igreja que é, ela mesma, movimento. Na Redemtoris Missio(73) assinala como uma novidade surgida recentemente em não poucas Igrejas o grande desenvolvimento dos movimentos eclesiais, dotados de um forte dinamismo missionário.
Na Igreja movimento, estes movimentos sobressaem e chamam a atenção pela sua novidade e por um dinamismo espiritual, missionário e evangelizador; supõem uma forte interpelação para outras realidades eclesiais mais antigas e tradicionais que o tempo foi anquilosando e que a modernidade fez com que experimentassem uma amarga decepção de impotência, assim como a ineficácia dos seus métodos, ainda que tivessem algum desejo de evangelizar e não só de «manter a fé».

A Catequese com Crianças

Image hosted by Photobucket.com

A catequese com crianças é abordada expressamente no número 37 da Catechesi Tradendae. Este número começa por referir a mudança na vida da criança, que deixa o âmbito estritamente familiar para se abrir socialmente, quer na escola, quer na Igreja. É tempo de começar a catequese orgânica, precisamente o contrário da anterior, a do despertar religioso, que é ocasional e de acordo com o que as circunstâncias da criança se propuserem. Esta catequese, agora, tem como objectivo introduzir a criança na vida da Igreja.
Esta iniciação tem a sua raiz no Baptismo, celebrado pouco tempo depois do seu nascimento. A esta etapa da catequese cabe a iniciação orgânica e sistemática, em ordem a uma primeira síntese de fé. A iniciação realiza-se em Igreja e é a ela que cabe essa missão, levada a cabo pelos catequistas. Estes são o referente comunitário, para a criança, que tem nele não só o referente, como também o meio e o método para chegar à plena iniciação cristã, através do testemunho.
A graça baptismal, donde partimos na catequese de infância ordinariamente, deve ser desenvolvida pelo catequizando, com a ajuda do catequista, de modo a conseguir-se a profissão de fé, elemento interior deste sacramento e objectivo da catequese(DGC 66).
Esta catequese inicial tem como objectivo a primeira síntese de fé, transmitindo à criança a fé que a Igreja confessa, celebra, vive e ora, tudo isto na comunidade e com o dever de dar testemunho(DGC 85-87). Por isso, esta catequese é didáctica, mas visando o testemunho de fé que a criança deve dar. Para isso, devem ser transmitidos todos os principais mistérios da fé e as suas repercussões na vida da criança. Salvaguarda-se que isto se deve acomodar à idade e às capacidades da criança.
Esta etapa catequética (DGC 178) deve proporcionar uma síntese elementar da história da salvação e um contacto com a Sagrada Escritura, deve também possibilitar que a criança seja capaz de levar uma vida de oração, quer pessoal quer comunitária. Que saiba participar nos sacramentos, nomeadamente na Eucaristia, de forma activa e frutuosa. Também se espera que a criança comece a agir com consciência cristã, vinculando a sua vida a Cristo e que, por isso, assuma opções concretas, conformes à .
Porque é eminentemente educativa, a catequese da infância deve preocupar-se por desenvolver aqueles recursos humanos que formam o substrato antropológico da vida cristã: são eles o sentido da confiança, a gratuidade, o dom de si mesmo e a participação alegre na vida de fé.
De referir também a catequese de iniciação não tem como objectivo a mera preparação para os sacramentos, mas sim promover que realizem um itinerário pessoal de vida cristã, no qual se inserem os sacramentos como momentos fortes do crescimento da fé. Os sacramentos são, isso sim, momentos fortes da maturidade cristã que a criança vai alcançando.
A catequese que dá sentido aos sacramentos possibilita também que eles sejam vividos numa dimensão vital. Por isso, a verdadeira catequese não se fica apenas na dimensão gnoseológica, antes impregna toda a vida da criança, todas as suas dimensões e capacidades, levando-a a viver com alegria a sua opção por Cristo, dando testemunho d?Ele no meio em que vive. A sua vida agora gira não só em torno da família, mas também no ambiente escola: dois ambientes educativos vitais.
A catequese familiar é, de certo modo, insubstituível, pois é aí que se pode verificar aquele ambiente acolhedor e positivo onde, pelo positivo dos adultos, se pode dar a primeira sensibilização explícita e prática de fé.
É à família que cabe a missão dos despertar religioso, mas isso nem sempre acontece, pelo que ao iniciar-se a catequese na paróquia se deve ter em especial atenção aqueles que não tiveram o despertar religioso, para que, com tacto e delicadeza, a comunidade paroquial saiba tratar convenientemente cada caso que, como é óbvio, deve merecer um tratamento especial.

Uma cultura com sentido

A sociedade actual é animada pela comunicação, e apesar de se terem descoberto nela limitações, contradições e práticas que a obrigam a adaptar-se e a transformar-se, muitas das suas estratégias permanecem ainda ocultas, ambíguas. Muitas das suas consequências são-nos ainda desconhecidas. É necessário compreendê-las, uma vez que a mentalidade resultante daqui modela a cultura, e os modos de pensar tornam-se diferentes dos do passado: a técnica progrediu tanto que transforma a face da terra e tenta já dominar o espaço.
O progresso que se faz sentir é imparável: a ciência e a técnica continuarão a desenvolver-se segundo uma lógica que lhes é imanente e necessária, na qual cada indivíduo é chamado a tomar responsabilidades. Importa achar os meios mais adequados para lhes limitar os danos. Assim, o mundo tecnológico apresenta-se como algo de enigmático aos nossos olhos, tanto mais que acarreta consigo um estado de crise preocupante. Esta é-o porque não tem paralelo com nenhuma época anterior. A especificidade desta vem-lhe da enorme mudança que a caracteriza.
A resposta à questão do sentido era, normalmente, herdada do ambiente familiar, social ou religioso circundante. Há, pois, uma infinidade de sentidos, desde os primórdios da humanidade até hoje. Exemplos disso são a história das religiões, da filosofia e da literatura. E mesmo da arte. Hoje não é assim.
Perante as diversas vagas de sentido, que chegam até a contradizer-se, surge a inevitável pergunta se não haverá um verdadeiro sentido que acabe por se impor? Pode surgir a postura que reconhece o homem sedento de absoluto, que não se realiza nesta vida, sem contudo negar a possibilidade de vir a realizar-se. Perante a morte, a radicalidade do problema humano faz emergir na consciência a aspiração que o habita: realizar-se infinitamente. «Queria era sentir-me ligado a um destino extra-biológico, a uma vida que não acabasse com a última pancada do coração»(Miguel Torga).
A partir da morte pode reconhecer-se, também, a impotência do homem para construir sozinho a sua realização. «O homem é um animal compartilhante. Necessita de sentir as pancadas do coração sincronizadas com as doutros corações, mesmo que sejam corações oceânicos, insensíveis a mágoas de gente. Embora oco de sentido, o rufar dos tambores ajuda a caminhar. Era um parceiro de vida que eu precisava agora, oco tambor que fosse, com o qual acertasse o passo da inquietação»(Miguel Torga). É aqui se abrem duas hipóteses: ou o homem reconhece que a vida terrena – projecto e aspiração a ser mais – tem sentido e abre a possibilidade da esperança de um futuro transcendente; ou aceita que a vida não tem sentido e é o desespero total.
A descoberta do sentido para a vida, integrando o sentido da morte, revela a precariedade e a finitude de uma vida sobre a qual assenta o desejo de absoluto que se espera. É a descoberta da liberdade ansiada, aquela que se tem devido a uma liberdade transcendente. O desejo de liberdade infinita do homem dá lugar à descoberta da condição de possibilidade da liberdade humana: Deus. A realização humana surge a partir do ser pessoa, da relação.
Mas o sentido é um dom, oferecido pelo mistério do Verbo encarnado. «Na realidade, o mistério do homem só no mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente. […] Cristo, novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai e do seu amor, revela o homem a si mesmo e descobre-lhe a vocação sublime»(GS 22). O mistério do homem revela-se através do mistério de Cristo, chamado a participar da sua filiação. Quando o homem descobre que é amado pelo Pai, em Cristo e através do Espírito, revela-se a si mesmo, descobre a grandeza de ser objecto da benignidade divina, receptor do amor do Pai revelado em Cristo. O mistério trinitário é o único capaz de realizar o homem, é o «mistério iluminador» do sentido (René Latourelle). A expressão desse mistério faz-se pela vivência da comunhão, onde o ser «não sem os outros» (Michael de Certaux) impele para a solidariedade e para o diálogo. Miguel Torga escreve que «a Bíblia, o livro dos livros, nos ensina que não há homem sem homem, e que o próprio Cristo teve, a caminho do Calvário, a fortuna dum cireneu para o aliviar do peso da cruz (a dor incurável da solidão). Para mim, pelo menos – continua Torga -, feito dum barro tão frágil e vulnerável, que necessito de ser amado durante a vida e de acalentar a esperança de continuar a sê-lo depois da morte».
Jesus Cristo, através da sua vida e pregação, é o mediador do sentido, o único intérprete dos problemas humanos. Em Cristo, o homem pode compreender, realizar e superar-se continuamente; pode ver, por fim, realizada a sua identidade. O ser insaciado, sacia-se.
Falar do homem é falar de comunicação, já que o ser humano não pode passar sem comunicar; partilhando com o outro as suas intuições, verifica a sua validade. É este exercício que impele o homem para uma vida comunitária.
À teologia cabe o «estudo sobre Deus», de um Deus que quer estar em relação estreita com o homem: por isso, as questões deste devem ser tidas em conta por aquela ciência, em ordem a uma oferta de alternativas válidas, dialogadas com as categorias de pensamento usadas pelo homem contemporâneo.
Deus, numa relação de amor salvífico com o homem, sai do Seu mistério, revelando-Se. O homem, convertendo-se, responde com a fé à verdade transformadora. Por isso, continua a ser tarefa prioritária dizer, hoje, a Revelação.
A Palavra de Deus apresenta-se, no Antigo Testamento, sob muitos aspectos, mas mantém a característica de ser uma palavra que, simultaneamente, revela e esconde: não se deixa reduzir a simples significados verbais. No Novo Testamento, esvai-se a diferença de níveis de comunicação entre Deus e o homem, provenientes das diferentes naturezas. Jesus Cristo possibilita o encontro face-a-face de Deus com o homem, numa comunicação em que o emissor e o receptor se situam nas mesmas coordenadas de espaço e de tempo. Assim, Cristo é o comunicador perfeito, «na medida em que nele encontramos concentrada e realizada a imagem da possibilidade de realização da comunicação ideal» (M. Carnicella), expressão da totalidade, sem lugar para equívocos.
«Sabendo Jesus que chegara a Sua hora de passar deste mundo para o Pai, Ele que amara os Seus que estavam no mundo, levou até ao extremo o Seu amor por Eles»(Jo13 , 1). E o auge da doação: «a palavra articulada faz-se palavra imolada» (René Latourelle). Na Cruz, Jesus Cristo mostra o amor de Deus aos homens; a palavra de Deus esgota-se até ao silêncio. A hora da morte e do silêncio é a suprema expressão do amor oferecido à humanidade. Aquilo que na comunicação divina é incomunicável diz-se agora com os braços estendidos e o corpo dilacerado.
No acontecimento ressurreição – onde a humanidade de Cristo se torna veículo para a expressão e manifestação da Sua divindade -, Cristo ratifica-se como código e como chave interpretativa do código que permite penetrar a mensagem divina sem equívocos.
Face a Cristo, o «comunicador perfeito», subsistem ainda ruídos, provenientes do homem, da sua mesquinhez, do medo e da incapacidade para se interrogar. A comunicação perfeita só se realiza num contexto escatológico, onde o ruído é anulado e o homem entra em comunhão perfeita com Deus, num perpétuo e sempre novo diálogo.
À luz deste acontecimento, a relação entre o homem e Deus é, pois, reflexo do diálogo trinitário, gerador de comunhão amorosa, na qual o homem é chamado a participar. Apesar da dificuldade do cidadão hodierno – fechado sobre si e incapaz de se situar perante o dom -, é preciso continuar a anunciar o Deus que se fez homem e que diviniza a humanidade pela comunicação do seu ser pessoal.
Dizer esta notícia, com honras de primeira página, obriga a descobrir, em conjunto com os vários saberes, outros métodos de comunicar, que integrem a fé e evitem o absurdo. Processo capaz de ser realizado por aqueles que falam como se vissem o invisível, sempre em busca de novos métodos de contar a verdade, marcados sempre pelo imprevisível.
Nesta dinâmica, o cidadão «acabará por sentir, no mais íntimo da sua humanidade, o apelo duma Proposta transcendente, que foi por vezes rejeitada enquanto expressa em paradigmas ultrapassados, mas que surge agora, nova e disponível, para a reinvenção do futuro»(Luís Archer). De um futuro com um Deus tão transcendente que não se deixa reduzir a simples verbalizações que aprisionam, mas tão próximo que chama cada homem, do âmago de uma nova cultura, a uma comunicação libertadora.
A fé, deste modo, não só dialoga com as diversas culturas como é capaz de gerar uma nova cultura.

Uma pedagogia para a Iniciação Cristã – Conclusão

Concluo dizendo que convém ter presente que a catequese de iniciação tem uns objectivos que, para além da socialização religiosa, contempla o desenvolver a graça baptismal, através da evangelização, realizando uma primeira síntese de fé pessoal, a personalização da fé, juntamente com a iniciação sacramental.
Os conteúdos são eminentemente educativos, com o objectivo de desenvolver aqueles recursos humanos que formam o substrato antropológico da vida de fé. Ter-se-á em conta a História Sagrada, apresentando a narração dos acontecimentos e as personagens de uma forma existencial e orante. Também se deve procurar apresentar Jesus Cristo, de forma inicial e sistemática, na totalidade do seu Mistério (Salvador e Redentor). Apresentar-se-á a Igreja e a vida eterna. A iniciação sacramental será também tida em conta, pelo que se apresentam os sacramentos da Igreja e se ensina a participar neles, apresenta-se também a liturgia, dando atenção ao rito, ao sinal, ao símbolo e à representação. Acima de tudo, tendo presente que a liturgia é o catecismo vivo, faz-se a relação entre o que se celebra e o que acredita.

Uma pedagogia para a Iniciação Cristã – V

Por último, na coordenada psico-pedagógica vamos ter presente que se trata de uma pedagogia integral e de uma pedagogia da fé.
A pedagogia precisa de ser integral, ou seja, que verse o saber (cognitivo-intelectual), o ser (afectividade, sentimentos e valores) e o fazer (comportamentos). Esta pedagogia precisa de ser equilibrada, na fidelidade ao homem e a Deus (lei da encarnação).
A pedagogia da fé é o modo de acompanhar o catequizando em ordem à profissão de fé, com os critérios próprios da fé. Para isso bebe da pedagogia de Deus e da pedagogia da Igreja. Daqui que não se pode ser mestre e pedagogo da fé dos outros se não se é discípulo convicto e fiel de Cristo na Sua Igreja(cf DGC 142).
Esta pedagogia deve ser considerada como o processo de amadurecimento e de crescimento na fé, desenvolvido de maneira gradual e por etapas; inspira-se, como fonte e modelo, na pedagogia de Deus manifestada em Cristo e na vida da Igreja, e conta com a acção do Espírito Santo na Comunidade e em cada cristão. A comunidade ajuda com o exemplo e a oração para que se dê o passo do homem velho para o homem novo, lutando contra o mal, com a ajuda da graça de Deus, em ordem a fazer a experiência alegre de ser salvo por Jesus Cristo.
A pedagogia catequética deve conseguir alcançar os três objectivos: instruir, transmitindo informação e conhecimentos seguros, transmitindo certezas e convicções; iniciar, levar cada catequizando a transformar-se no homem novo, realizando a conversão de toda a sua personalidade, a conversão do coração; por último deve também educar, ou seja, formar a pessoa e propondo-lhe novos comportamentos conformes à fé que aprende a professar.
Os objectivos, para além da socialização religiosa, são o desenvolver a graça baptismal, através da evangelização, realizando uma primeira síntese de fé, de forma pessoal, a personalização da fé, juntamente com a iniciação sacramental.
Os conteúdos são eminentemente educativos, com o objectivo de desenvolver aqueles recursos humanos que formam o substrato antropológico da vida de fé. Ter-se-á em conta a História Sagrada, apresentando a narração dos acontecimentos e as personagens de uma forma existencial e orante. Também se deve procurar apresentar Jesus Cristo, de forma inicial e sistemática, na totalidade do seu Mistério (Salvador e Redentor). Apresentar-se-á a Igreja e a vida eterna. A iniciação sacramental será também tida em conta, pelo que se apresentam os sacramentos da Igreja e se ensina a participar neles, apresenta-se também a liturgia, dando atenção ao rito, ao sinal, ao símbolo e à representação.
Acima de tudo, tendo presente que a liturgia é o catecismo vivo, faz-se a relação entre aquilo que se reza e aquilo em que se crê.

Uma pedagogia para a Iniciação Cristã – IV

Chegou a vez da dimensão espiritual. Convém ter bem presente que a eficácia da catequese é e será sempre um dom Deus, mediante a acção do Espírito Santo, sem o qual não é possível fazer catequese ou qualquer outra acção evangelizadora, por muito elaborados que estejam os planos e por mais sofisticados que sejam os meios humanos e materiais. Sem Espírito nada se consegue, pois o Espírito Santo é o protagonista de toda a missão da Igreja(cf RM 21); é o mestre interior, principal catequista e princípio inspirador de todas as actividades catequéticas.

O Catequista
Convém recordar também o papel do catequista, que é elemento essencial da catequese, o catecismo vivo: enviado pela Igreja, numa comunidade concreta, realiza a sua vocação profética no seu grupo de catequese, onde anuncia, ilumina, persuade, testemunha, colabora com a função da comunidade cristã. Para que haja, pois, iniciação cristã é preciso um iniciador, chamado catequista, que é a alma da catequese. Aquele que é «chamado a ensinar Cristo deve, portanto, antes de mais nada, procurar esse lucro sobreeminente que é o conhecimento de Jesus Cristo. Tem de aceitar perder tudo (…) para ganhar a Cristo e encontrar-se nEle e conhecê-Lo, a Ele, na força da sua ressurreição e na comunhão com os sofrimentos, conformar-se com Ele na morte, na esperança de chegar a ressuscitar dos mortos»(CCE 428). O catequista é, então, uma pessoa de fé profunda, que conhece os mistérios de Deus e vive em plena comunhão com eles, emergido no amor de Deus. Vive-os em Igreja, por isso é dotado de uma clara identidade cristã e eclesial, pelo que nada do que é humano lhe é alheio, logo possui uma profunda sensibilidade social(cf DGC 237). O catequista respeita e vive de «um princípio essencial da visão cristã da vida: o primado da graça»(NMI 38).
Image hosted by Photobucket.com
(c) 2003 – Pedro Nogueira

Uma pedagogia para a Iniciação Cristã – III

A coordenada catequética centra a sua atenção no específico da catequese que é o estar ao serviço da iniciação cristã, tendo presente que a fé é um dom de Deus. Esta iniciativa divina e primeira do Pai verifica-se nas palavras e gestos que Jesus Cristo ressuscitado realiza na Igreja, sua Esposa e nossa Mãe, que, sob a acção do Espírito Santo, guia e conduz aqueles que são chamados a entrar na comunhão de vida trinitária.
A Igreja, através da iniciação cristã, manifesta a sua identidade de mãe e, enquanto incorpora o homem a Cristo, incorpora-o no Corpo de Cristo; enquanto gera cristãos, edifica a Igreja, de modo que podemos afirmar que pela iniciação cristã a Igreja gera a Igreja.
A Igreja realiza esta missão através de duas funções pastorais intimamente relacionadas: a catequese e a liturgia. A catequese é um elemento imprescindível da iniciação cristã e está vinculada aos sacramentos de iniciação.
A catequese é, então, uma formação orgânica e sistemática na fé, mas mais que um mero ensino, pois é uma aprendizagem de toda a vida cristã, uma iniciação cristã integral. Ajuda o discípulo de Cristo a transformar o homem velho, assumindo os seus compromissos baptismais e a professar a fé a partir do coração. É ainda uma formação de base essencial, centrada no essencial da experiência cristã, nas certezas mais profundas da fé e nos valores evangélicos mais fundamentais. Habilita o catequizando a receber o sólido alimento posterior, na vida ordinária da comunidade eclesial, à qual também inicia. Ou seja, incorpora na comunidade que confessa, celebra, vive e ora a fé, e dela dá testemunho.
Este itinerário, todo ele eclesial, leva à incorporação efectiva e afectiva do catequizando no Mistério de Deus, e tem no catecumenado baptismal o seu modelo inpirador(cf DGC 90).
Desde os tempos apostólicos, o «tornar-se cristão» exige um caminho de iniciação, com diversas etapas, que pode ser percorrido rápida ou lentamente (cf CCE 1229). E uma vez que é um processo de conversão é essencialmente gradual e cristocêntrico, porque está ao serviço daquele que decidiu seguir Cristo, em ordem à personalização da fé, com a ajuda dos catequistas, que são os testemunhos e pontos de referência, que ajudam a integrar fé e vida, a criar identidade cristã.

Despertar Religioso
A preceder esta etapa catequética de iniciação cristã deve realizar-se o despertar religioso, no seio familiar, onde a criança recebeu os primeiros rudimentos da fé, as breves orações com as quais aprende a dialogar com Deus, desenvolveu os inícios da educação da consciência moral, entre outras. Esta educação cristã é mais testemunhal que instrutiva, mais ocasional que sistemática, não está estruturada em períodos, antes é permanente e quotidiana.