Metáfora

O homem é, por si, um ser sociável. Precisa dos semelhantes para se realizar. Para entrar em contacto com eles usa a linguagem, a fim de comunicar as suas experiências. Mas o universo das experiências leva-nos à beira do mistério último não susceptível da experiência direta, apenas indireta em, com e sob a nossa experiência quotidiana. Mas quando tentamos descrever este mistério falta-nos a linguagem. A experiência tem uma última dimensão inefável.
O homem, espontaneamente, relaciona as coisas entre si por imagens, comparações e símbolos. Com estes pretende exprimir as suas experiências e a sua situação no mundo.
A importância da analogia, ou pensamento analógico, vem do facto de se chegar a alguma coisa geral, por indução, a partir de coisas particulares e semelhantes. Na analogia estão presentes a unidade e a pluralidade, a identidade e a diferença. Como se vê possui uma estrutura dialéctica.
A analogia fundamental, em que todas se apoiam, é a analogia entis. A inteligência humana está aberta ao infinito. Na afirmação do particular inquieta-se, pois reconhece nele o infinito. É pela existência do finito que reconhece a existência do infinito, mas nota-se que são de maneira diferente e, ao mesmo tempo, não tão diferentes. Se assim não fosse não poderiam estar presentes no mesmo conhecimento: o conhecimento humano.

«Metamorfizar corretamente é ver – contemplar, ter olhar para – o semelhante. A epífora é este olhar e este lance de génio: o não ensinável, o não adquirível» (Paul Ricoeur).

«A metáfora é por excelência um tropo por semelhança». É esta que revela «a estrutura lógica do ‘semelhante’, porque, no enunciado metafórico, o semelhante é apercebido  apesar da diferença, apesar da contradição». É esta a estrutura lógica que dá vida à metáfora, que lança «o impulso da imaginação num ‘pensar mais’ ao nível do conceito», pois «as significações não são fórmulas estáveis mas dotadas de uma capacidade e de um dinamismo, que lhes permitem servir outros referentes e cooperar na inovação semântica».

A metáfora é considerada como uma forma de analogia. E o conhecimento por analogia é um conhecimento do semelhante pelo semelhante que detecta, utiliza, produz similitudes de maneira a identificar os objetos ou fenómenos que percebe ou concebe.
Para se verificar um pensamento o mais exato possível deve haver uma ideia dominante, alguma coisa que corresponda à característica principal do objecto e que dê unidade ao que é vário e disperso.
Em suma, nos conceitos análogos, apesar de existir diferenças, há também um enlace que possibilita o emprego das palavras com sentido e significado. A linguagem analógica ocupa o lugar intermédio entre o equívoco e o unívoco e expressa uma semelhança que inclui a igualdade na diferença. É uma semelhança de relações. 

No Catecismo da Igreja Católica a fé é vista como assentimento da inteligência e ao mesmo uma adesão pessoal total, bem como um ato eclesial e pessoal: «Pela fé, o homem submete completamente a Deus a inteligência e a vontade; com todo o seu ser, o homem dá assentimento a Deus revelador» (CCE 143); «Antes de mais, a fé é uma adesão pessoal do homem a Deus. Ao mesmo tempo, e inseparavelmente, é o assentimento livre a toda a verdade revelada por Deus. Enquanto adesão pessoal a Deus e assentimento à verdade por Ele revelada, a fé cristã difere da fé numa pessoa humana. É justo e bom confiar totalmente em Deus e crer absolutamente no que Ele diz. Seria vão e falso ter semelhante fé numa criatura» (CCE150); e continua dizendo que a fé é graça de Deus (CCE 153), ato humano (CCE154), livre (CCE 160), recepção da salvação e da vida eternal (CCE 161- 164).

Redes Sociais e Evangelização



O desafio, que as redes sociais têm de enfrentar, é o de serem verdadeiramente abrangentes: então beneficiarão da plena participação dos fiéis que desejam partilhar a Mensagem de Jesus e os valores da dignidade humana que a sua doutrina promove. Na realidade, os fiéis dão-se conta cada vez mais de que, se a Boa Nova não for dada a conhecer também no ambiente digital, poderá ficar fora do alcance da experiência de muitos que consideram importante este espaço existencial. (Mensagem do Papa Bento XVI para o 47º dia Mundial das comunicações sociais)

Uma Igreja que acolhe a todos – VI

A pessoa com deficiência tem direito a experimentar na sua vida o olhar sanador de Jesus Cristo, que é sempre nova, plenificadora e cheia de esperança. Esta valorização radical com que Jesus dignificava vai muito para além da simples capacidade, da utilidade, das possibilidades sociais que uma pessoa pode ter ou dos coeficientes intelectuais que possua. A força libertadora de Cristo manifesta-se sobretudo na Sua Páscoa. Escutemos o número 616 do Catecismo da Igreja Católica:

É o «amor até ao fim»  que confere ao sacrifício de Cristo o valor de redenção e reparação, de expiação e satisfação. Ele conheceu-nos e amou-nos a todos no oferecimento da sua vida. «O amor de Cristo nos pressiona, ao pensarmos que um só morreu por todos e que todos, portanto, morreram» (2 Cor 5, 14). Nenhum homem, ainda que fosse o mais santo, estava em condições de tornar sobre si os pecados de todos os homens e de se oferecer em sacrifício por todos. A existência, em Cristo, da pessoa divina do Filho, que ultrapassa e ao mesmo tempo abrange todas as pessoas humanas e O constitui cabeça de toda a humanidade, é que torna possível o seu sacrifício redentor por todos. (CCE 616)

A debilidade humana adquire, em Cristo, um novo rosto. Ele cura-nos da ideia, infelizmente tão difundida, de que o sofrimento, a dor e demais limitações do ser humano, são um castigo. Em Cristo, sabemos que os nosso sofrimentos têm um sentido. Mais, fugir do sofrimento ou negá-lo nunca será fonte de alegria. É, e nunca deixará de ser uma ilusão. Com tudo o que isso acarreta.
Assumindo a verdade da nossa condição de seres humanos, criados e amados por Deus, estamos em melhores condições para perceber que o sentido é um dom, oferecido pelo mistério do Verbo encarnado. «Na realidade, o mistério do homem só no mistério do Verbo encarnado se esclarece verdadeiramente. […] Cristo, novo Adão, na própria revelação do mistério do Pai e do seu amor, revela o homem a si mesmo e descobre-lhe a vocação sublime»(GS 22). O mistério do ser humano revela-se através do mistério de Cristo, chamado a participar da sua filiação. Quando  cada pessoa se descobre que é amado pelo Pai, em Cristo e através do Espírito, revela-se a si mesmo, descobre a grandeza de ser objecto da benignidade divina, receptor do amor do Pai revelado em Cristo. O mistério trinitário é o único capaz de realizar o homem, é o “mistério iluminador” do sentido. A expressão desse mistério faz-se pela vivência da comunhão, que se experimenta na participação comunitária.
Jesus Cristo, através da sua vida e pregação, é o mediador do sentido, o único intérprete dos problemas humanos. Em Cristo, o ser humano pode compreender, realizar e superar-se continuamente.
É esta certeza, com sabor a Boa Nova, que torna cada vez mais compreensível o desejo de Deus de libertar cada pessoa das suas angústias, dos medos, da culpabilidade, da desvalorização. E ensina-nos a abrir de forma sempre nova o nosso coração ao homem ferido, na proximidade compassiva, na escuta, na valorização mais profunda de tudo o que é, no desejo de que se desenvolva e alcance a sua plenitude». Cada pessoa, que sente em si a debilidade, tem o direito de descobrir na sua vida o olhar originar de Jesus, a sentir-se reconhecido nela e a experimentar o seu sabor.

Uma Igreja que acolhe a todos – V

A comunidade eclesial, para o ser, realiza a sua ação ao estilo de Jesus, que com gestos e palavras intimamente unidos (Cf. DV 4), e com o seu testemunho explicita que

«Evangelizar, para a Igreja, é levar a Boa Nova a todas as parcelas da humanidade, em qualquer meio e latitude, e pelo seu influxo transformá-las a partir de dentro e tornar nova a própria humanidade: “Eis que faço de novo todas as coisas”. No entanto não haverá humanidade nova, se não houver em primeiro lugar homens novos, pela novidade do batismo e da vida segundo o Evangelho. A finalidade da evangelização, portanto, é precisamente esta mudança interior; e se fosse necessário traduzir isso em breves termos, o mais exato seria dizer que a Igreja evangeliza quando, unicamente firmada na potência divina da mensagem que proclama, ela procura converter ao mesmo tempo a consciência pessoal e coletiva dos homens, a atividade em que eles se aplicam, e a vida e o meio concreto que lhes são próprios» (EN 18).

À Boa Nova de Cristo, cada pessoa responde com o «obséquio pleno da inteligência e da vontade» (DV 5), o que leva à maturidade da fé. Aliás, a maturidade da fé só acontece quando as três faculdade – inteligência, afecto e vontade – estão harmonizada e convertidas em Cristo.
Mas aqueles que são afetados por alguma incapacidade também têm necessidade de encontrar na vivência da comunidade cristã um olhar de compreensão, bondade e alegria que lhes permita sentirem-se amados e acolhidos. Mais, que lhes permita suprir, pela caridade dos irmãos, aquilo que a saúde, ou falta dela, não lhe permite viver.
Frente aos valores do ativismo e da eficácia, as pessoas com deficiência mostram à Igreja, de uma forma ineludível, o valor da relação , a riqueza do coração, o valor da humildade e da debilidade. São profetas silenciosos. É fácil deixá-los de lado, considera-los inúteis e passar ao lado. Sem dúvida, o seu silêncio é um chamamento à vivência comunitária, um convite à comunhão.
Diante das curas realizadas por Jesus Cristo e de toda a Sua vida, a comunidade eclesial é convidada a promover uma saúde autêntica e a viver de forma saudável a doença e a deficiência. Jesus, na Encarnação, manifesta o valor e a dignidade de todo o ser humano. A sua beleza e a sua importância, dando-lhe um sentido, sempre novo, e uma esperança que nada nem ninguém poderá destruir.

Uma Igreja que acolhe a todos – IV

A ação pastoral visa levar Cristo, torna-l’O presente, na vida de cada ser humano (Cf. EN 14). E esta recepção acontece na liberdade e expressa-se por uma vida de discipulado, o que implica a totalidade do ser humano. E já desde os gregos que nós sabemos que o que distingue o ser humano dos outros elementos da natureza é este ser dotado de inteligência, afecto e vontade que, cada um ao seu modo, e desde que convertidos, permitem ao ser humano deixar-se guiar pela Graça de Deus e viver como cristão.
O problema surge quando, mercê de uma qualquer doença ou deficiência, alguma ou algumas destas dimensões estão afetadas, impedindo o normal desenvolvimento do ser humano. A grande tentação, também dentro da Igreja, é “esquecer” estes irmãos, não lhe pedindo nada, para também não ter que lhes dar, ou ainda, não ter que se lhes dar a si mesmo. E, para sossegar as consciências, procura-se que através de alguma ação benemérita lhes seja garantida a satisfação das necessidades mais básicas: alimentação, higiene e habitação.
Esta atitude, de si muito desumana, é também um grande prejuízo para a comunidade eclesial, pois vê-se privada da participação dos “prediletos do senhor”, aqueles com quem o Senhor melhor mostrou o Seu plano salvífico, o Reino de Deus.

«O Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu para anunciar a Boa-Nova aos pobres; enviou-me a proclamar a libertação aos cativos e, aos cegos, a recuperação da vista; a mandar em liberdade os oprimidos, a proclamar um ano favorável da parte do Senhor» (Lc 4, 18-19).

Uma Igreja que acolhe a todos – III

O contexto cultural, e até eclesial, em que nos movemos, afasta o débil, porque choca. Choca com os valores preponderantes do poder e da força, da eficácia e da eficiência, mas sobretudo com a vontade de uniformizar procedimentos pastorais, como se todos fossem iguais…
O acolhimento assume, assim, uma importância única na pastoral, eu diria mesmo que assume a categoria verificadora da autenticidade da ação pastoral: uma pastoral que não acolhe a todos não é “católica”, universal. Esta catolicidade advém, mais do que de qualquer técnica ou opção metodológica, da vida teologal. Quem acolhe expressa a sua relação com Deus e a relação Deste com cada ser humano. Ou dito de outra forma, mostra a sua vida espiritual e consequente compromisso apostólico.
Quando nos referimos aos frágeis estamos a referir-nos àqueles que, mercê da sua condição física, social ou psíquica precisam de uma relação especial e de uma atenção específica na ação pastoral, que mostre que a Encarnação de Cristo revela a cada ser humano o seu valor, dignidade, beleza e esperança, abrindo-lhe propostas de sentido, de santidade, através do anúncio da Boa Nova. Esta Boa Notícia que, «sobretudo nos ambientes de maior marginalização e difíceis, nos convida a não confundir o mais original e específico da santificação com a realização da perfeição psíquica ou moral. A santificação é um ato de Deus ao qual responde a liberdade humana. É um consentimento de ordem espiritual, é um mistério de Amor que salva gratuitamente a quem o acolhe em liberdade». Este é um acontecimento misterioso que ultrapassa todo e qualquer psiquismo, mas que deixa as suas marcas na vida daqueles que, segundo as suas capacidades e o seu modo de expressar, aceitaram, com Cristo, passar da morte à vida.

Uma Igreja que acolhe a todos – II

Este acolhimento, que é muito mais do que a simples recepção e conjunto de técnicas, opõem-se à recepção distante e fria que pode até acolher o cliente ou o utente, mas dificilmente acolherá a pessoa no seu todo. E sem olharmos para a pessoa, não podemos dizer que realizamos uma ação pastoral. Esta, ao olhar para a pessoa no seu todo, ao ter uma abordagem holística, não se deixa confundir nem circunscrever a grupos específicos, possivelmente mais fáceis, antes se percebe como ação pastoral, seguidora de Cristo Bom Pastor, quando acolhe a todos, nomeadamente os mais frágeis, como é o caso das pessoas com deficiência.

Uma Igreja que acolhe a todos – I

A Igreja, pelo menos depois do Concílio Ecuménico Vaticano II, percebe-se com “sacramento universal de salvação” que, numa perspectiva escatológica, sabe que

«Cristo, elevado sobre a terra, atraiu todos a Si (cfr. Jo. 12,32 gr.); ressuscitado de entre os mortos (cfr. Rom. 6,9), infundiu nos discípulos o Seu Espírito vivificador e por Ele constituiu a Igreja, Seu corpo, como universal sacramento da salvação; sentado à direita do Pai, actua continuamente na terra, a fim de levar os homens à Igreja e os unir mais estreitamente por meio dela, e, alimentando-os com o Seu próprio corpo e sangue, os tornar participantes da Sua vida gloriosa. A prometida restauração que esperamos, já começou, pois, em Cristo, progride com a missão do Espírito Santo e, por Ele, continua na Igreja; nesta, a fé ensina-nos o sentido da nossa vida temporal, enquanto, na esperança dos bens futuros, levamos a cabo a missão que o Pai nos confiou no mundo e trabalhamos na nossa salvação (cfr. Fil. 2,12).Já chegou, pois, a nós, a plenitude dos tempos (cfr. 1 Cor. 10,11), a restauração do mundo foi já realizada irrevogavelmente e, de certo modo, encontra-se já antecipada neste mundo: com efeito, ainda aqui na terra, a Igreja está aureolada de verdadeira, embora imperfeita, santidade. Enquanto não se estabelecem os novos céus e a nova terra em que habita a justiça (cfr. 2 Ped. 3,13), a Igreja peregrina, nos seus sacramentos e nas suas instituições, que pertencem à presente ordem temporal, leva a imagem passageira deste mundo e vive no meio das criaturas que gemem e sofrem as dores de parto, esperando a manifestação dos filhos de Deus (cfr. Rom. 8, 19-22)» (LG 48).

O acolhimento, como ação, exprime e expressa não só a recepção de todos, mas sobretudo a aceitação e a admissão. Por isso, as relações humanas, que são aquelas que de nós dependem, exercem-se com afetividade, cordialidade, calor humano e hospitalidade, já que são “sacramento” do que Deus quer ser para cada pessoa

Sem fé pessoal não há reflexão teológica

A fé teologal, suscitada e fundada em Jesus Cristo, é assumida como elemento que institui a consciência confessante da Igreja, que lhe dá a possibilidade de conhecer a verdade sobre o destino da existência, precisamente quando ela se entrega à revelação confiável do Abba-Deus em Jesus. Captar de forma inteligível a estrutura essencial deste acontecimento de fé, que se repete sem cessar, para apreender a fundamentação reflexa da qualidade não ilusória (nem arbitrária nem dogmática) do seu princípio, é o objetivo do trabalho intelectual da teologia.
(cf. Perangelo Sequeri)